Sexta-Feira, 19 de abril de 2024

A sauna de Serginho Calmon - Por Sérgio David

Publicado em 30/06/2020. https://jornalterral.com.br/t-VNl

Por Sérgio David

Na década de 1990, na cidade de Linhares, o ponto de encontro para uma cerveja bem gelada, uma relaxante sauna e um monte de boas prosas era a Sauna do Serginho Calmon. Localizada ao lado da Limaq e de frente para a BR 101, para lá, todo final de tarde, dispostos a superar o estresse da labuta, se dirigiam empresários, agricultores, engenheiros, médicos, advogados, funcionários públicos, poetas, estudantes, trabalhadores, desempregados e até mesmo malandros de todas as matizes.

O proprietário, que dava o nome ao estabelecimento, a despeito da simpatia e do carisma era, amiúde, pragmático e irascível, o que, paradoxal e surpreendentemente, em muito contribuía para a fidelidade da freguesia.

No balcão de entrada existia uma estufa com os tira-gostos. Todo cliente desavisado, ao encostar na dita estufa, tomava um choque. Imediatamente era surpreendido com o comentário do proprietário.

Essa estufa só dá choque em quem tem tendência a ser gay. Você tomou choque?

Quando os clientes questionavam o preço de R$ 1,00 por um jiló cozido, vinha a resposta imediata:

Compra quem pode, paga quem tem.

Quando os que gostavam de fazer sauna ouvindo música reclamavam da única e repetitiva fita do Nélson Gonçalves, Serginho mandava:

– Estou no meu ambiente de trabalho, coloco a música que eu gosto. Quem quiser ouvir outra música que traga sua fita.

Na parede de azulejo, atrás do balcão de entrada, era comum observar, escrito com pincel atômico, os seguintes dizeres:

– Atenção! Relação dos devedores: Pé de Pato: R$ 12,50; Binha: R$ 36,00; Bigode: R$ 27,30; Zé do Frango: R$ 67,00; Cabeção: R$ 18,20...

E o ultimato:

– Favor providenciar o pagamento com urgência, sob pena de suspensão do direito de frequentar o estabelecimento. Assinado: A Gerência.

Hoje isso daria processo.

E a sauna, a despeito disso, a cada dia ficava mais cheia de clientes.

Até que numa rara quarta-feira de sauna vazia, estávamos eu e o Serginho proseando quando, do outro lado da BR, em frente a GMC, passa um sujeito falando ao celular.

Imediatamente o Serginho assobiou e gritou:

– Nassife, venha até aqui.

O cara atravessou a pista e já veio sorrindo em nossa direção.

– Nassife, conta aqui pro meu xará o que aconteceu com você na ida para aquele baile em Vitória.

E o cara, um dos árabes mais simpáticos e de maior astral que conheci, contou-nos o caso que segue, sorrindo e sem demonstrar complexo algum.

Nassife nasceu sem um antebraço e com cinco pequenos dedinhos disformes, colados ao pequeno braço.

Quando jovem, Nassife e mais três amigos saíram de Linhares para o Baile da Primavera, em Vitória. Próximo à capital, o Fusca em que viajavam colidiu de frente com uma Brasília que trafegava na contramão. E foi uma verdadeira tragédia.

Da Brasília foram retirados, seriamente feridos, uma senhora e seus dois filhos. No Fusca, o amigo motorista bateu com a cabeça no vidro dianteiro e abriu um rombo na testa. Os outros dois amigos voaram para fora do carro.

Nassife que, viajava atrás, foi o único a não ter ferimento algum, salvo os cinco dedinhos do pequeno braço que se romperam ao bater no encosto do banco dianteiro.

Face à gravidade do acidente, a pista imediatamente encheu-se de enfermeiros e paramédicos. Quando os feridos de caso mais grave já estavam sendo colocados nas macas, eis que Nassife sai do carro, meio tonto e com aquele bracinho cotó jorrando sangue

A enfermeira chefe não se conteve quando viu a cena e, emocionada, exclamou:

- Meu Deus!!!!! Meu filho, calma, calma que tudo vai correr bem.

Ao que Nassife, ainda assustado, respondeu:

– Eu estou bem, minha senhora, não aconteceu nada de grave comigo.

E a enfermeira, muito comovida:

– Calma, meu filho, calma. Você ainda está em estado de choque.

Em seguida, abraçou e empurrou a cabeça de Nassife para o seu pescoço de modo a impedir que ele visse o ferimento.

Depois, sussurrou baixinho para os demais enfermeiros.

– Rápido, rápido, um balde de gelo, procurem o braço dele, procurem o braço dele...

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