Homenagem ao meu querido tio, Dr. Milton David (in memorian), que há muitos anos contou-me esse “causo”.
Na década de 1950 o “Colégio de Muqui”, localizado na cidade de Muqui, região Sul do Estado, destacava-se como o melhor do Espírito Santo. Para ele, as famílias de mais posse da região enviavam seus filhos para, em regime de Internato, cursar os três anos do “cientifico”.
Dirigido pelo Dr. Dirceu, renomado advogado, excelente professor e notável político, o colégio primava pela excelência no ensino. Dali os que eram aprovados saíam para prestar o vestibular, com índices de aprovação de mais de 90%, nas mais importantes faculdades do país.
O colégio foi construído no século XVI pelos Jesuítas em formato quadrangular, com dois pavimentos e fachada em estilo colonial. Nos dois pavimentos da frente localizavam-se as salas dos professores e da direção. Nas laterais as salas de aula, ao fundo os alojamentos dos internos e ao centro a quadra de esportes.
Um belo dia, a direção resolveu atender ao pedido dos alunos, mudando o piso da quadra, que era de cimento e passou a ser de taco. Para evitar arranhões no piso, o Dr. Dirceu mandou colocar uma placa com os seguintes dizeres:
“É proibido jogar de sapato”.
Logo abaixo aparecia a ordem, em latim: “Dura Lex sed lex”, ou seja, “a lei é dura mas é lei. Típico das ordens do Dr. Dirceu.
E assim, durante os três anos de curso os alunos jogavam, todas as tardes, somente descalço ou de tênis, respeitando a placa:
Até que, no último ano do científico, durante a aula de Latim, o professor Dr. Carlos Ruggiero resolveu arguir os alunos. Correu os dedos no Livro de Chamada e chamou:
– Camilo Aymbiré
O “Gordo” Aymbiré não era de muita sapiência, posto que para passar de ano necessitava, amiúde, das colas dos colegas Maurinho, Eveline e Teotônio. Ademais, dele diziam as más línguas que só teria conseguido chegar ao terceiro ano graças às propinas do tio deputado, que era compadre e do mesmo partido político do Dr. Dirceu.
Aymbiré, debaixo dos seus cento e dez quilos, levantou suado, pálido como um cadáver e com voz trêmula balbuciou:
– Pois não, professor.
– Traduza a frase: “Dura lex sed lex”
Aymbiré sorriu aliviado, limpou com as mãos o suor do rosto, virou um pouco o corpanzil para trás, em direção à turma, e disfarçadamente mostrou os dez dedos das mãos em sinal de que viria a nota máxima. Encheu-se de brio, estufou o peito e com voz firme bradou:
– É proibido jogar de sapato!!