Final de 1982, a Empresa Capixaba de Pesquisa Agropecuária (Emcapa), em busca de mais recursos financeiros para a pesquisa, resolveu reativar o Programa de Melhoramento com Fruteiras de Clima Temperado na região Serrana do Estado.
Por não contar mais com pesquisadores especializados para a função, o seu então diretor técnico, Dr. Morethson Resende, optou por uma solução caseira, convocando a mim e ao colega Pedro Garlindo Alvêas para reimplantar e coordenar o referido programa. E na primeira reunião com o presidente e o diretor técnico da empresa, questionei:
– Dr. Morethson, eu trabalho com genética de papaya e o colega Pedro com melhoramento de cenoura. Por conseguinte, nada a ver com maçãs, peras, pêssegos, caquis e figos.
– Não se preocupem com isso. Vocês irão para Campinas (SP) para um treinamento com essas fruteiras e ficarão bam-bam-bans no assunto, ele respondeu.
E lá fomos nós para o Instituto Agronômico de Campinas para um treinamento de 15 dias, como se isso fosse o bastante para que nós, pesquisadores tropicais, entendêssemos todo o processo tecnológico das culturas de clima frio.
Retornamos para o Espírito Santo e fomos imediatamente lotados na Estação Experimental de Venda Nova, para coordenar o Programa Estadual de Pesquisa de Fruteiras de Clima Temperado do Estado.
No primeiro dia de trabalho fomos visitar um pomar comercial do mais tradicional produtor de pera de Venda Nova do Imigrante. A fazenda era tão especializada na cultura que até o cachorro, de nome Biré, se alimentava somente de pera.
Depois de saboreamos um delicioso café torrado na roça, falei baixinho ao ouvido do Pedro do meu temor de encarar aquele produtor com tanta experiência e tradição na cultura das pereiras. E Pedro, naquele seu jeito ousado e resoluto, replicou:
– Ora Sérgio David, fique tranqüilo. Vai dar tudo certo! Estamos na época da dormência e as pereiras não têm folhas, assim não há como errar diagnósticos.
E lá fomos nós plantação morro acima, de bicos calados e ouvidos atentos, tomando aquela aula prática de 25 anos que treinamento algum de 15 dias poderia equiparar-se.
Tudo corria bem até que na descida, próximo à casa do produtor, Pedro Garlindo, meio que se sentido incomodado por não ter podido repassar nenhuma nova informação tecnológica, estancou em frente a uma árvore totalmente sem folhas na horta do produtor e perguntou: “E esse pé de maçã aqui é para teste?”
O produtor espantou-se com a pergunta e retrucou: “Qual pé de maçã?”
E Pedo Garlindo, cheio de pose, concluiu com todo o seu saber científico:
– Esse aqui que está em fase de dormência e por isso com senescência total das folhas, provavelmente devido às baixas temperaturas que redundaram em acúmulo de ácido abscísico no caule.
O produtor imediatamente replicou:
– Mas doutor, isso aí não é maçã, é também um pé de pera que a muié plantou aí na horta dela.
Pedro Garlindo Alvêas corou, cambaleou, pigarreou e meio que sem graça, para não perder a pose de doutor, apontou para a única flor remanescente em um dos galhos e treplicou, soltando a pérola:
– Ahhhhh.... Beeem que eu tava conhecendo essa florzinha.