Sábado, 23 de novembro de 2024

João Turco - Por Sergio David

Publicado em 12/10/2020. https://jornalterral.com.br/t-nrm

Por Sergio David

João Jorge Abu Dioan foi o mais emblemático de todos os imigrantes árabes de Vargem Alta, região serrana do Espírito Santo.

Veio do Líbano na década de 1950, como os sírio-libaneses do Estado, de navio aportando na Barra de Itapemirim. De lá seguiu direto para o distrito de Matilde. fincando o seu primeiro comércio.

Cerca de dez anos depois comprou a padaria do meu avô e se estabeleceu de vez em Vargem Alta.

Passou a ser conhecido como “João Turco”. Era baixinho, de cabelos brancos, crespos e penteados para a frente. A despeito dos olhos zuis, não era afeito a vaidades terrenas. Exceção feita à sua origem. Como viveu no Líbano sob o domínio da França, gabava-se de ser franco-sírio.

Durante a década de 1970 sua padaria “São Jorge” foi considerada a sede do nosso bloco carnavalesco “Vai Quem Quer”.

Um dos foliões mais presentes era o advogado João Cardoso, conhecido como “Feijão”. Ex-ponta esquerda do Estrela do Norte, era um mulato meio folgado, meio oportunista, mas de boa índole. Casado com a filha de um influente político, logo conseguiu a indicação para a Chefia do INSS em Cachoeiro de Itapemirim.

Pois bem. No carnaval de 1982, o “Crioulo”, como era chamado no Bloco, chega no balcão da padaria e pede:

– Seu João, por favor, uma gelada e um tira-gosto.

E o tio, que não era dado a gentilezas, para a nossa surpresa, vem pessoalmente  servi-lo.

Quinze minutos depois, Feijão, já sentado na calçada, faz outro pedido:

– Seu João, por obséquio, mais uma gelada.

João Turco traz duas cervejas na bandeja para o mulato.

E o nego não se contenta. Mais dez minutos:

– Seu João, sai uma porção de fritas com mais uma cerva?

– Joooooorgee, bede sua mãe brá fritar badada.

E nós, estupefatos com tamanha servidão.

– Seu João, dá pra sair mais uma gelada e uma porção de provolone com azeitona?

– Oswaaarrrrdo, bega e gorta salame brá Feijão.

Mais alguns minutos e o crioulo manda:

– Seu João, mais uma cerva e uma porção petit-pois.

- ÍÍÍÍÍÍlhaaaa, bede brá Berenice brebarar uma porção de bedidi-boá.

Lá pras tantas, o primo Ulisses pede para fechar a conta.

Feijão, como de hábito, dá aquela famosa fugidinha para o banheiro para ficar fora do racha.

Ulisses, que era o mais pragmático dos primos, percebeu a do crioulo e ordenou:

– Tio João, estamos em dez, onze com o Feijão, portanto, divide por onze.

E aí é que fomos entender o porquê de tamanha prontidão, gentileza e servidão.

O Feijão tinha conseguido a proeza aposentar o turco sem que o mesmo pagasse sequer um carnê de contribuição para o INSS.

E para culminar, o Tio João Turco ainda teve a esperteza de replicar:

– Bor onze não, eu vai dividir bor dez.

– Ai lá, eu vai dividir bor dez borque

Em meu badaria, Feijão não baga conta!

* As matérias, textos e artigos publicados a partir de terceiros não significam que estejamos de acordo com as posições apresentadas por seus autores ou fontes. Apenas estamos buscando divulgar conteúdos que possam contribuir, de alguma maneira, para prestar um serviço social de ajuda e orientação.
Fundado em 29/11/1990, o Terral possui circulação impressa e estende sua atuação para o ambiente online. Acompanhe-nos por meio das redes sociais e compartilhe as matérias.
EXPEDIENTE

Diretor
Daniel Porto

Jornalista Responsável
Daniel Porto - MTE Nº 3.802/ES

Assessoria Jurídica
Dra. Alciene Maria Rosa

Edição do Impresso
D. Porto Editora - ME

Desenvolvimento
Saulo Porto

Gestor de Conteúdo
Iorran M. Porto - MTE Nº 4.149/ES

CONTATO

Rua João Calmon, 880 Centro, Linhares - ES


(27) 3151 6247 / 99857 9813 contato@jornalterral.com.br



© 2019. Todos os direitos reservados.